BRASIL EM FOCO
Germano Oliveira*
A Câmara dos Deputados está se preparando para encenar o segundo ato do golpe contra a democracia brasileira — um golpe dentro do golpe. Tudo se resume à articulação dos principais partidos de centro-direita (PL, Republicanos, PP, União Brasil e PSD), que, juntos, somam mais de 360 deputados — número suficiente para aprovar o que bem entenderem, inclusive uma Proposta de Emenda à Constituição. Esses partidos estão se unindo para votar um projeto que concede anistia aos criminosos envolvidos na trama golpista de 8 de janeiro de 2023. E, pior, essa iniciativa não se limita aos bagrinhos que depredaram as sedes dos Três Poderes, mas alcançaria também o núcleo estratégico que planejou o assassinato de Lula, Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes, com o objetivo de reconduzir Jair Bolsonaro ao poder, mesmo após sua derrota nas eleições para o PT.
É a ideia mais estapafúrdia dos últimos tempos na política brasileira. Um escárnio. Como imaginar que, após mais de três anos de investigações sobre os atos antidemocráticos praticados pelo ex-presidente e sua turba — com o ministro relator dos processos correndo risco de morte, sendo ameaçado interna e externamente, e até perdendo o direito de viajar, manter contas e possuir imóveis nos Estados Unidos, em decorrência de sanções impostas pelo presidente Donald Trump —, o Congresso cogite perdoar os responsáveis? Sanções essas instigadas pelo deputado golpista Eduardo Bolsonaro, que permanece em território americano tramando contra o País, com o único objetivo de salvar a pele do pai e a fortuna por ele amealhada enquanto esteve no poder.
A vergonhosa anistia

Essa proposta, articulada pela bancada da extrema-direita comandada pela família Bolsonaro, é tão vergonhosa quanto a anistia concedida em 1979 pelos militares do golpe de 1964, quando foram perdoados os opositores do regime de exceção. Naquela ocasião, também foram anistiados integrantes das Forças Armadas acusados de prisões ilegais, torturas brutais e assassinatos de mais de 400 pessoas que lutaram pela restauração da democracia durante os chamados anos de chumbo. Agora, a direita quer repetir a mesma fórmula. Após a condenação dos réus do 8 de janeiro — com penas que variam de 25 a 43 anos de prisão —, entrarão em campo os parlamentares que sempre estiveram do lado errado da história. No passado, bajularam os generais de plantão, cúmplices dos atos ilegais; hoje, alinham-se aos militares que tentaram dar um novo golpe para manter o ex-capitão no poder. É desta vez, esses nefastos parlamentares se unem ao governador Tarcísio de Freitas (SP) que tem feito o trabalho sujo de unir os partidos de direita em torno desse objetivo.
Por sorte, temos um Poder Judiciário comprometido com a manutenção da soberania nacional e com a aplicação das leis e da Constituição. Graças aos onze magistrados do Supremo Tribunal Federal e às dezenas de desembargadores que ocupam cargos estratégicos no STJ e nos tribunais federais espalhados pelos estados brasileiros, temos uma Justiça independente, que não se dobrará às pressões internas ou externas que visam humilhar o País e suas autoridades constituídas. O Brasil está dando uma demonstração cabal ao mundo — sobretudo ao presidente autocrata Donald Trump — de que nossa democracia é robusta e não é comandada por donos de fazendas de bananas.

*Germano Oliveira é Diretor do BRASIL CONFIDENCIAL.