Pesquisador observa o diâmetro dos angelins-vermelhos gigantes: raízes achatadas que compõem o tronco e contribuem para a sustentação. (Foto: Léo Ramos Chaves/Revista Pesquisa FAPESP)

Faltando dois meses para a COP30, a conferência global sobre mudanças climáticas que será realizada em novembro em Belém (PA), a floresta amazônica volta ao centro das discussões internacionais.

Entre os temas que devem ganhar destaque está a proteção das árvores gigantes da região — exemplares centenários que ultrapassam 80 metros de altura e desempenham papel estratégico na regulação do clima, no ciclo das chuvas e na captura de carbono.

O angelim-vermelho (Dinizia excelsa), espécie nativa da Amazônia, é o protagonista dessa narrativa.

Em 2022, pesquisadores localizaram no município de Almeirim (PA) um exemplar com 88,5 metros de altura e 3,15 metros de diâmetro — o equivalente a um prédio de 30 andares. A árvore, com idade estimada entre 400 e 600 anos, está na Unidade de Conservação Estadual de Uso Sustentável Floresta Estadual do Paru (Flota do Paru), na Região de Integração Baixo Amazonas, no oeste paraense.

Potencial climático

A presença dessas árvores gigantes foi evidenciada pela ciência apenas recentemente. Os primeiros exemplares foram encontrados em 2019, e ao todo, 20 árvores com mais de 70 metros foram localizadas em uma área próxima ao Rio Jari, na divisa entre os estados do Pará e Amapá.

“Essas árvores apresentam praticamente o dobro de tamanho das alturas médias das espécies amazônicas, que ficam em torno de 40 a 50 metros. Então, a gente está falando de árvores que absorvem o dobro de carbono e, portanto, podem contribuir o dobro para a regulação de clima”, explica o pesquisador Diego Armando Silva, do Instituto Federal do Amapá (IFAP).

Segundo ele, uma única árvore dessas pode representar cerca de 80% da biomassa da parcela de floresta em que está inserida — uma área aproximada de 1 hectare. Isso significa que um único indivíduo pode ser capaz de absorver 80% do CO₂ presente nessa área. Ainda são necessários estudos para entender se essas árvores também emitem grandes volumes de gás carbônico, qual o papel que desempenham na evapotranspiração e como contribuem para o lançamento de água na atmosfera.

Idade e estudos

A estimativa de idade dos angelins-vermelhos foi feita com base em estudos de datação de cedros, espécie que demarca claramente os anéis de crescimento. “Eles chegaram à idade aproximada de 260 anos. A partir daí, traçamos uma estimativa de que esses angelins-vermelhos têm em torno de 400 a 500 anos”, afirma Silva.

Ameaças e contradições

Apesar de sua relevância ecológica e científica, muitas dessas árvores estão fora de unidades de conservação. A segunda maior árvore do Brasil, com 85,4 metros, está em Laranjal do Jari (AP), onde a exploração comercial do angelim-vermelho é permitida.

“Embora o Amapá seja um estado notoriamente coberto por áreas protegidas, a gente tem duas circunstâncias que chamam a atenção. A primeira delas é que muitas árvores gigantes estão fora de unidades de conservação, e a segunda é que é permitida a exploração comercial do angelim-vermelho”, alerta Ângela Kuczach, diretora executiva da Rede Pró-Unidades de Conservação.

A campanha “Proteja as Árvores Gigantes”, liderada pelo instituto O Mundo Que Queremos, atua na mobilização da sociedade civil e na pressão por mais proteção. “Na época que foi descoberta, a maior árvore estava dentro de uma floresta estadual, a Flota do Paru, que permite extração madeireira. A categoria existe para isso, para manejo florestal”, lembra Ângela.

Avanços e riscos persistentes

A mobilização resultou na criação, em setembro de 2024, do Parque Estadual Ambiental das Árvores Gigantes da Amazônia (Pagam), unidade de conservação de proteção integral com 560 hectares. Apesar do avanço, a área ainda enfrenta ameaças.

“A gente está falando de uma área que tem muito garimpo em volta, muito ameaçada pelo desmatamento, pela grilagem. A própria presença de CARs [Cadastro Ambiental Rural] sobrepostos, que a gente identificou lá em 2022”, destaca Ângela.

O CAR é um instrumento de declaração voluntária para propriedades privadas, que não pode ser aplicado a áreas públicas como unidades de conservação. Em 2022, foram identificadas declarações fraudulentas e um aumento de 23% no desmatamento na Amazônia. A Floresta Estadual do Paru foi a terceira mais atingida entre as unidades de conservação de uso sustentável, segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento analisados pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

Gestão e estrutura

Segundo Nilson Pinto, presidente do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor), as ações para implementação do Pagam estão em andamento. “Fizemos um edital, o chamamento público, para que as pessoas se habilitassem, entidades, autoridades e moradores, para comporem o Conselho Gestor. Estamos nesse processo agora. Isso é fundamental, porque é o conselho que vai aprovar o plano de manejo, elaborado pela equipe do nosso instituto, com o apoio da Fundação Amazônia Sustentável”, afirma.

O Ideflor é responsável pela gestão das unidades de conservação do Pará. Segundo Pinto, a fiscalização na Floresta do Paru já cumpre papel relevante. “A Floresta Estadual do Paru é muito bem preservada. Temos várias empresas fazendo manejo florestal sob supervisão do Ideflor e muito pouco de desmatamento, muito pouco mesmo”, afirma. Ele acrescenta que o difícil acesso ao local das árvores gigantes funciona como proteção natural. “Tem algumas ocorrências que nós combatemos permanentemente de garimpo. Na Flota Paru, não no parque estadual. Não chegam nem perto do parque das árvores gigantes, onde não há desmatamento”, reforça.

Para Ângela Kuczach, é preciso avançar nas próximas etapas de proteção e buscar a ciência como aliada para novas descobertas. “A gente pode ter a maior árvore gigante ainda não descoberta, e ela já pode estar ameaçada, porque pode estar fora de uma área de proteção”, alerta.

Diego Armando Silva reforça que, além das novas descobertas, é preciso investir em pesquisas e monitoramento das árvores já conhecidas. “Os primeiros passos são a criação do comitê gestor e do plano de manejo, onde estarão, possivelmente, o plano de visitação das árvores, de educação ambiental, de pesquisa e gestão da informação, que contribui significativamente em uma estrutura mínima para que a gente possa fazer as pesquisas efetivas e ter a capacidade de receber pesquisadores de diferentes regiões do Brasil e do mundo”, defende.

A Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Amapá foi procurada pela reportagem da Agência Brasil, mas até a publicação da matéria não houve resposta. O espaço segue aberto.

Com informações da Agência Brasil.

Em 2019, foram encontrados os primeiros exemplares; em 2022, a localização de um angelim-vermelho de 88,5 m de altura, equivalente a um prédio de 30 andares, revelou a maior árvore do Brasil, Almeirim (PA). (Foto: Ag. Pará)